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Uma grande vitória poder divulgar o nosso projeto!
A OFICINA DE LEITURA E CRIAÇÃO LITERÁRIA
3A. IDADE CLARETIANAS FOI UM DOS PROJETOS SELECIONADOS PARA APRESENTAÇÃO NO III FÓRUM DO PLANO NACIONAL DO LIVRO E DA LEITURA E NO III SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE BIBLIOTECAS, EM AGOSTO DE 2010.

domingo, 19 de junho de 2011

Objetos Biográficos

Imagem captada na net, apenas para ilustrar

Nas oficinas de abril/maio, trabalhamos o conceito de objeto biográfico vinculado à Literatura. Partimos do pressuposto de Eclea Bosi:

"Podem ser considerados objetos biográficos, aqueles que envelhecem com o possuidor e se incorporam à sua vida(...). Cada um desses objetos representa uma experiência vivida, uma aventura afetiva (...) Eles são incorporados à vida das pessoas, representam experiências vividas, uma aventura afetiva do proprietário (...) Só o objeto biográfico é insubstituível: as coisas que envelhecem conosco nos dão a pacífica sensação de continuidade."

Nesse contexto, analisamos a obra "O Penhoar Chinês", de Rachel Jardim; também, o conto "Os objetos", de Ligya Fagundes Telles; a letra da cançao do Chico Buarque e Francis Hime "Trocando em Miúdos" e, finalmente, o poema "Despedidas", de Affonso Romano de Sant'Anna.

Os textos produzidos pelos oficineiros, em prosa e verso, são marcados pela delicadeza das memórias reinventadas, que, quando partilhadas, recriam uma época.

A tesoura de alfaiate

Texto de D. Mariângela J. P. Gomes

Foto captada na internet. Tesoura semelhante à do relato.


          Tantos são os objetos que tenho guardados em minha memória, no coração e no meu baú. Hoje parei em frente a ele e resolvi abri-lo.  Qual não foi a minha surpresa no primeiro toque,  ao deparar com um pacote que fez meu coração bater mais forte. Percebi logo o que era,  então o desfiz.

          Ali estava a tesoura do Heitor, sua companheira  de trabalho durante todos os muitos anos que exercera o honroso ofício de alfaiate. Comovida, olhando para ela, leio gravado próximo ao parafuso que prende as duas lâminas : GALIER – PARIS.

          É uma tesoura bem grande com pontas longas bem finas, que prestou muitos serviços no passado, hoje na melhor idade, já com seus quase oitenta anos, descansa aposentada no baú.

          Transporto-me agora ao passado, é de manhã, estou na loja, isto é, Alfaiataria Excelsior, que leva o slogan : “Elegância Máxima em Linhas Diferentes”.

           Heitor defronte ao balcão largo e comprido estende a peça de casemira, em seguida com o giz e esquadro, traça o molde com as medidas do freguês. A fita métrica sempre dependurada no pescoço. A tesoura ali ao lado, ansiosa, intrépida, altiva, certeira, inicia mais uma jornada, guiada como numa dança por mãos tão hábeis, bailando para cá, girando para lá sobre os traços no tecido, cortando com suas lâminas afiadas, vai dando formas ao modelo.

          Quem será o elegante felizardo que irá desfrutar o belo traje?

          Volto ao presente, a tesoura aqui ao meu lado me remota a muitas outras recordações daquele tempo bom e feliz!




Fiel companheiro

Texto de Geni Bizzo

Foto tirada pela autora do texto, no museu da cidade de
Conservatória/RJ; o rádio é igualzinho ao da história relatada.

Dia 19 de Junho de 1958. A hora? Não me lembro. De pé, ouvidos atentos embolávam-nos ao redor de pequenina estante acompanhando a voz nervosa do locutor esportivo naquele dia que seria um marco na história do futebol brasileiro. Oito anos depois da derrota histórica no Maracanã quando perdemos para o Uruguai o Brasil apresentava uma nova geração de craques que dominou o cenário mundial do futebol por alguns anos. O mundo se encantava com jogadores como Pelé e Garrincha -principais estrelas- e nós, nos encantamos com os suecos que, embora derrotados, aplaudiram de pé a seleção quando o capitão Bellini recebeu a taça e a colocou sobre a cabeça para que todos pudessem fotografar.

A transmissão era muito ruim com chiados que dificultavam o entendimento, mas nosso personagem principal foi fundamental para que pudéssemos vibrar soltando o grito de campeão sufocado na garganta desde 1950. Estou falando do nosso amigo inseparável que nos atendia sempre embora levasse uns safanões vez em quando para que trabalhasse direito. Um rádio SEMP, tamanho médio que fora adquirido três anos antes para que meu pai pudesse acompanhar o resultado das eleições.

Um apaixonado pela cidade e admirador ferrenho de Joaquim Geraldo Correa candidato a prefeito de Araçatuba em 1955, meu pai acompanhava passo a passo o resultado do pleito. No dia mesmo que fora às urnas, a meia noite colava o ouvido no rádio para ouvir o nome do seu candidato quando da retirada da primeira cédula, da primeira urna. Dizia ele que o primeiro voto computado é que decidiria a eleição. Zizinho( como era carinhosamente chamado) foi eleito e, graças a ele o rádio passou a ser nosso companheiro fiel.

Nessa época a Radio Nacional do Rio de Janeiro vivia seu apogeu e chegava aonde não chegavam a escola nem a imprensa facilitando inclusive a compreensão dos analfabetos. Mesmo nas fazendas mais distantes e isoladas as pessoas podiam acessá-lo graças às baterias ou acumulador e acompanhar a divulgação das músicas “caipiras” que traziam a essência e o romantismo do homem do campo.

A programação da rádio era imensa, mas o forte eram os shows de auditório principalmente comandado por Cesar de Alencar onde desfilavam estrelas como Emilinha Borba, Marlene, Ângela Maria, Ivon Curi, Luiz Gonzaga,Cauby Peixoto e uma constelação imensa que levava os fãs clubes ao delírio e não raro ás brigas na defesa de seus ídolos. As eleições de rei e rainha do rádio eram acompanhadas com muita atenção. Também o grande sucesso da época O Repórter Esso – “Testemunha ocular da história” “O primeiro a dar as últimas” - cuja música tema ecoa em nossos ouvidos até hoje - era programa obrigatório em todos os lares.

Acompanhávamos tudo com muita atenção e aproveitávamos para cantarolar as canções das paradas de sucesso, principalmente as marchinhas de carnaval e as serestas Outro grande fenômeno eram as radio novelas, mas nos eram proibidas, pois segundo meu pai era só choradeira e mau exemplo. Gostávamos e ouvíamos os demais programas quando conseguíamos, pois como já disse as transmissões eram às vezes horríveis e com os chiados perdíamos a metade da apresentação ou a paciência quando então desistíamos. Os Programas como: Consultório sentimental, Jararaca e Ratinho, Seriado “Jerônimo – o herói do sertão” “Edifício Balança, mas não cai” faziam parte de nossa seleção.

Embora a Rádio Nacional fosse a mais famosa ouvíamos também outras emissoras O Programa PRK 30 esse da Radio Mayrink Veiga – era o preferido de meu pai que dava gostosas gargalhadas. Também sintonizávamos a rádio Record - A voz de São Paulo, Difusora, Tupi e tantas outras que se dividiam nas transmissões diretas ou em cadeias. A rádio Bandeirantes - líder no esporte – também transmitia o famoso programa “Na serra da Mantiqueira” com a dupla caipira mais famosa do Brasil – Tonico e Tinoco - Acostumados a ouvir e imaginar nos perdíamos em divagações – casar a voz com seu dono era nosso sonho.As donas de casa cumpriam seus afazeres domésticos sempre com um rádio ligado e o ouvido atento.

As emissoras locais eram também muito ouvidas principalmente durante o dia quando as transmissões de emissoras da Capital se tornavam quase impossíveis. Programas como-“Lembrei-me de Você” onde se oferecia uma música por ocasião de aniversário ou casamento, e a “Ave Maria” às dezoito horas eram sagrados em nossa casa.

Os anos se passaram e o pequeno rádio acompanhava nossa trajetória. Quando surgiram os Movimentos como Jovem Guarda, Tropicalismo, e Festivais da MPB já trabalhávamos e estudávamos à noite e, com os ouvidos colados por causa do baixo volume obrigatório para não acordar os demais, acompanhávamos nossos ídolos não nos importando com a hora tardia e com a obrigação de acordar cedo.

Com o advento da TV acentuado pela revolução de 64 houve o declínio dos Anos de Ouro da Rádio Nacional – conhecida como “Escola do rádio” possibilitando a ampliação de outros canais, e a devoção que se conhecia pelos programas foi transferida para a Televisão embora sem aquele brilho do rádio.

As transmissões pela TV custaram a chegar ao interior, mas mesmo depois de sua chegada nós fomos os últimos a te-la em casa para podermos acompanhar, pelo menos, os vídeos tapes. E durante muito tempo ainda o rádio continuou sendo nosso fiel companheiro mesmo porque não era necessário parar os afazeres para nos entregarmos aos sonhos coisa que a TV exigia.

As muitas histórias que esse amigo nos proporcionou ficaram registradas em nossa memória e descrevê-las seria impossível, mas o maior registro foi com certeza o da importância que ele teve em nossas vidas. Mas como nada é definitivo ele também “passou”.

Que pena! Foi ficando no esquecimento depois que deixamos nossa casa. Soubemos que seu interior foi comido por ratos guardado que estava num quartinho dos fundos. Depois não tivemos mais notícias, mas a lembrança e a saudade, essas ficaram e ficarão para sempre.

Relíquias de Família



Texto de Maria de Lourdes da Silva Pinto


Em minha casa possuo muitas relíquias de família, como: móveis de sala de jantar feitos no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo., que pertenceram aos meus sogros; quadros, porcelanas, diversos cristais, lembranças da vida dos entes queridos que já nos deixaram.
Entretanto, que me emocionaram muito são: uma caixa de cartas, amarelecidas pelo tempo, escritas pelos meus pais - João Alfredo e Maria - e pelo meu avô materno - João Carvalho - que não cheguei a conhecer. Estas cartas contam fatos de suas vidas. Ao lê-las, senti o quanto o amor e o carinho eram importantes para eles.
Transcrevo aqui, na íntegra, uma carta de meu avô João endereçada ao meu pai, que me emocionou, deveras, cujo assunto era a resposta do "pedido de casamento" e meus pais ao meu avô:

"João Alfredo,
Fiquei satisfeito com a tua carta. Estamos entendidos. Auguro que serão felizes. A Maria é boa mocinha. Não tem preparo, mas havendo indulgência de parte a parte tudo caminhará bem. Devemos confiar 'Naquelle' que distribue com abundância os seus tesouros às nossas pobres creaturas, a quem devemos nos envergonhar da nossa pequenes, porque 'Salomão', me parece que foi ele, no livro da Sabedoria, disse: 'Que o pó, o humile pó também se elevou às alturas'. Há, além disso, o atavismo de família. Os avós dela foram bondosíssimos e de probidade invejável. Por conseqüência, Avante!
Causa lástima a posição do 'Hermes*'. Aquilo é um pandemonium. Estão doidos. E o tropeiro lá se foi para o Sul, a cata de novas diabruras. Que fique por lá e não volte mais. São os meus desejos.
Excetuando eu, todos daqui vão passando bem. Antes de ontem fiz 70 anos, porisso o miolo está esfarelado.
Saudações a todos e até.
Teu amigo certo,
João Carvalho.
São Paulo, 27 de janeiro de 1912."

Continuando, a outra relíquia, também importante para mim, é um porta-guardanapos de prata, que pertenceu à minha tia Maria Santos, irmã de meu pai. Esta relíquia possui grande valor estimativo. Titia, quando entrou para o convento de São vicente de Paulo, como freira vicentina trocou o seu nome, como era de praxe, por Luiza de
Marillac, discípula do santo. Ela também fez votos de pobreza, de modo que seus pertences de valor foram distribuídos. Ao meu pai ela doou o porta-guardanapos que, após o falecimento de meu pai, foi entregue a mim, como recordação de titia Maria. 
Por isso, escolham com atenção; criem e renovem espaços de suas casas com a mistura de móveis, enfeites e relíquias da família, herança de familiares queridos, não vendam e não doem. Enquanto viverem, conservem essas preciosidades.


* Referência ao presidente do Brasil, Hermes da Fonseca.








Meus objetos antigos

Poema de Letícia D. Brunelli


Na vida, coisas vem ... coisas vão.
Algumas porém, vão ficando
pois nos tocam fundo no coração,
nosso passado nos lembrando.

Tenho dois objetos na vida para me lembrar
de uma pessoa que me foi dada para amar.
Um é de ouro, outro de porcelana,
ambos presentes de minha avózinha  Ana.

De ouro é um anel bem pequenino
onde meu nome quase não se consegue ler
O outro é um bule de chá, que traz consigo
um suporte que serve para o líquido aquecer.

O anel ganhei quando completei sete anos
Tem na chapinha meu nome gravado.
Da minha mão esquerda nunca foi afastado,
só dela saindo em raros e especiais eventos.

Então fui crescendo ...
e o anel foi mudando
de dedinho em dedinho,
chegou no mindinho !

O bule que da minha Bisavó tinha sido,
Tem frisos dourados e rosas em decalques;
é de porcelana francesa M.Rodon de Limoges,
peça remanescente de um conjunto desaparecido.

Na cristaleira ficava, e eu com encantamento
Sempre o admirei, desde tenra idade.
Vovó o trouxe para mim, no dia do meu casamento.
embrulhado tal qual uma preciosidade.

Até hoje o anelzinho está no meu dedo
e o bule exposto entre os meus cristais.
Um dia talvez, o bule atraia algum neto
e ele seja escolhido entre outros quetais.

Quando eu morrer, por certo, vão tirar
O pequeno anel do meu dedo e guardar;
Da sua presença não mais vou precisar
Pois lá no céu Vovó estará a me esperar!

O Cuco

Texto de Dalva Garbuio



Vou escrever o texto que a Professora Sandra passou para nos lembrarmos de algo que tínhamos em casa.

O que veio à minha mente foi um relógio Cuco, que tenho até hoje em minha casa. O cuco de parede funciona e nele vemos as horas e ouvimos as badaladas todas as horas do dia.Ouvimos as badaladas quando o dia começa, é simples, mas muitas recordações me vem à cabeça. Hora do almoço, do jantar, suas badaladas juntamente com o entardecer, as seis horas ou dezoito, hora da Ave Maria.

Ficamos com a alma cheia de alegria, ao recordar que é hora da Ave Maria. As badaladas simples e preciosas, alegram o meu dia.

Cartas

Texto de Terezinha Cattai

Escrever sempre foi um prazer para mim desde que aprendi as primeiras palavras, depois as frases e os pequenos textos.


Quando estava no Primário (antigo 1 .a 4. série) eu adorava as atividades de leitura e escrita, como por exemplo, criar uma história observando uma gravura bonita e colorida que a professora colocava na lousa e com aquela figura eu me esquecia do tempo e do lugar onde estava.

Ao aprender a escrever uma carta e o seu significado em minha vida, descobri uma grande amiga, uma riqueza, uma imensa alegria.

A carta foi um Presente Especial que recebi da vida e sou feliz até hoje, porque apesar de existir o telefone fixo, o celular, o computador, ainda prefiro a carta escrita a mão, com papel especial para cada pessoa e cada momento.

Depois que aprendi a escrever cartas na. 4. Série, a primeira foi para minha tia Shirley que morava em Bauru. Agradeci pela coleção de livros de aventuras com oito volumes e em especial Moby Dick e com ele fiz minha primeira (ficha) Ficha de leitura na 5.série.

Comecei a me corresponder com minhas primas de São Paulo e Bariri.

Por muitos anos me correspondi com minha prima Suzete e para várias cidades onde morou, pois meu tio trabalhou na construção de hidrelétricas em Bariri, Ibitinga, Iacanga, Porto Primavera, Água Vermelha e por último a de Ilha Solteira, quando se aposentou.

Nós nos correspondíamos todo mês . Assuntos nunca faltavam (filmes, paqueras, escola, roupa, cabelo, maquiagem, outros primos, casamentos, aniversários, artistas da TV, passeios, etc.).Sempre havia novidades, eram folhas e folhas de bloco para carta.

Essas cartas fizeram parte da alegria, do encanto, das descobertas, da inocência de minha adolescência e foi um marco especial na minha vida até hoje.

Ingressei no Estado como Professora em agosto de 1981e fui morar em São Paulo, mais um motivo para escrever cartas, para minha mãe, minha prima (agora casada morando em Indiaporâ), para amigas e meus ex-alunos da Escola Puríssimo onde dei aulas entre os anos 79, 80 e meio de 81.

Voltei a morar em Rio Claro em 1990 e as cartas continuavam, agora de São Paulo, Cosmópolis, de Limeira. Mas depois, por alguns anos a carta não fez parte da minha vida, me afastei até de minhas primas e assim ficou um vazio na minha comunicação com tias e primas, porque para mim, telefonar é um tanto mecânico, não consigo falar, transmitir tudo que estou sentindo, só se fala o essencial, algum motivo importante sem detalhes.

Há uns cinco ou seis anos voltei a me corresponder com minhas primas. Nossas vidas tomaram outros rumos, temos outros assuntos, novidades do século 21 mesmo ! Porque tudo está muito diferente de quando começamos a escrever nossas cartas (no século 20).

Mas, é o mesmo sentimento , o mesmo calor humano, a intimidade, o carinho, a saudade de tantos anos de amor, de amizade, de confiança nas confidências levadas e trazidas de volta em folhas de papel.

Por isso, escrever cartas para mim é algo aconchegante, carinhoso, me sinto fazendo parte da vida da pessoa, que parou, pensou em mim, escolheu as palavras e relembrou algum momento bom ou não, que vivemos juntas em algum lugar, algum dia de nossas vidas.

É como se estivesse me dando um abraço muito carinhoso para matar a saudade criada pelo tempo e pela distância.

As cartas fazem parte da minha vida, me sinto feliz ao escrevê-las, ao recebê-las e mesmo com toda complexidade, facilidade e rapidez dos computadores, eu ainda prefiro escolher um papel, pegar minha caneta, colocar meus óculos, pensar na pessoa e escrever uma carta com carinho e atenção especialmente para ela.

Tenho uma sobrinha de 21 anos, Aline, jogadora de futebol de salão, estudante de Educação Física, que está morando em Jacareí e também gosta de escrever , me escreve cartas lindas que me emocionam.

E através de suas palavras escritas, eu sinto o seu carinho, a sua atenção e o seu amor por mim, porque, apesar do computador, do celular, do telefone, ela que é jovem, escolhe um papel, pega a caneta, pensa em mim e me escreve CARTAS.

Moro numa pinacoteca

Meu amuleto

Texto de Hedi Duarte

Foto feita pela autora do texto

Eu não sei desde quando este crucifixo faz parte de nossa família, mas sei que quando eu nasci, ele já estava entre nos..........e quando pedíamos proteção a Ele nas horas difíceis, sempre fomos atendidos !

Quero relembrar momentos importantes da presença simbólica desta cruz entre nos.

Nasci em Berlin, capital da Alemanha, onde passamos toda 2. guerra mundial. Os bombardeios foram intensos, o medo de morrer constante. Eramos católicos, mas nem sempre frequentavamos a missa aos domingos, porem na “Missa do Galo” do Natal e na “Missa de Pascoa “ nunca faltavamos.

Lembro-me quando as sirenes tocavam para anunciar outro ataque aéreo, princi-palmente durante a noite, minha mãe me agasalhava, muitas vezes dormindo, e papai ainda me enrolava junto com o crucifixo, em meu edredom. Só com os documentos pessoais no bolso do paletó e comigo no colo, junto a figura de Jesus Cristo, meus pais corriam para o “Bunker”, um abrigo subterrâneo durante os bombardeios.

Alguns dias antes do fim da guerra papai resolveu escapar do comunismo que se aproximava e fugimos de nossa casa, deixando tudo para traz,saimos apenas com uma pequena valise de mão, trazendo algumas roupas e o crucifixo com Cristo. Não havia mais nenhum meio de transporte e assim andamos durante 3 semanas por estradas e caminhos para bem longe da cortina de ferro. As vezes uma fruta, um pedaço de pão e um copo de leite, ganhos de algum agricultor que encontramos no percurso, era nossa alimentação. Com sorte, as vezes conseguíamos permissão para dormir dentro do estabulo, junto a cavalos e vacas, em cima de um monte de feno.

Nestes tempos tão difíceis, muitas e muitas vezes eu observei meu pai em oração e discretamente com a mão na valise, eu acho que ele pedia orientação e animo para Jesus. Finalmente instalamo-nos em outra cidade e tudo se normalizou aos poucos.

Alguns anos depois viemos para o Brasil.

Novamente deixamos tudo para traz , menos o crucifixo, só que desta vez em clima de paz, Graças a Deus. Como imigração não é turismo, havia também limitações para bagagens. Minha mãe apenas trouxe um prato e um talher para cada e uma manteigueira como lembrança, além das roupas, também a maquina de costura, o meu violino e a harmonica.

O reinício em terra desconhecida também não foi facil. Meus pais já tinham idade avançada, mas nunca ouvi uma palavra de desanimo, ao contrario, gratidão por ter encontrado um canto na terra onde reina paz, brilha sempre o sol e termos frutas e alimentos frescos o ano todo.

O crucifixo de Cristo era sempre destaque na sala e parece que emanava paz, união e alegria.

Casei-me, o crucifixo voltou para meu lar após o falecimento de meu pai, pois minha mãe veio morar comigo.

Nas horas mais pesadas, quando eu já não tinha mamãe, perdi meu neto, meu filho , e após mais 3 anos, meu marido também. Tenho certeza que foi a presença do crucifixo com Cristo que me impulsionou para longe da depressão. Hoje eu considero este “Jesus na Cruz” o meu verdadeiro amuleto.

Manias e Virtudes

Texto de Silvia Galvani

Recentemente, Miguel – o caçula dos meus irmãos – ligou-me se não estaria em meio ás recordações que ainda conservava de meu pai, um álbum sobre a Copa do Mundo do ano de 1970.Pensei até que ele havia tirado do seu baú aquele telefone que, quando menino, ele fazia com duas caixas de papelão e barbante – e estaria pedindo uma ligação com a infância.Ou talvez, gostaria de passar isso para Ana Júlia sua neta de cinco anos. Estranhei seu pedido, mas como dizia minha mãe, “cada louco com sua mania” – resolvi pegar a caixinha com as lembranças.

Por coincidência, naquela semana, havia resolvido fazer uma faxina geral e jogar fora papéis velhos e velhas manias que, com o passar do tempo, parece que tendem a aumentar ou acabam se juntando com as novas, que vamos adquirindo. Não encontrei o que Miguel me pedira, mas uma das manias que meu pai herdara de minha avó: guardar notas novinhas, do pouco dinheiro que lhe vinha ás mãos. Ao morrer, encontramos dentro de um livro , uma porção delas, que já não valiam coisa alguma.

Como filha de peixe, peixinho é, também adquiri algumas esquisitices: colecionar miniaturas como garrafinhas, xícaras, joguinhos de chá e café. Para isso, contava com a colaboração da “madrinha” – era assim que vovó gostava de ser chamada. Vez em quando trazia uma peça para juntar ás outras, cuidadosamente arrumadas em uma estantezinha, feita especialmente para este fim, por um marceneiro amigo de meu pai.

O tempo passou, mas meu interesse agora era uma coleção de xícaras antigas que num móvel da sala de jantar, de vovó, muitas delas estavam expostas atraindo a atenção de pessoas amigas que por lá passavam. Tinha o privilégio de tocá-las, pois com a proximidade das férias escolares, era eu incumbida de lavá-las e recolocá-las no devido lugar, o que fazia com prazer e cuidados redobrados.

Caso observasse com mais atenção uma ou outra peça mais delicada, madinha então pedia para deixá-la sobre a mesa. Logo depois esta fazia parte da minha nova mania e da minha vida.

Conservo até hoje alguns objetos da minha coleção, o que não chega a ser TOC – Transtorno Obessessivo Compulsivo, do ponto de vista da moderna psicologia.

Vovó, a mulher de vida simples e mãos calejadas, deixou através desse seu gesto, legado bem mais valioso. Muitos desses presentes já não mais existem e não posso deixar para os meus, mas o que verdadeiramente gostaria que não se perdesse, pertence ao contexto das coisas simples que na vida podemos receber: perseverança, dignidade, desprendimento e amor ao próximo.

A velha caneca

Texto de Lícia Mônaco Perin


Tomo nas mãos a grande caneca de plástico para chopp.Giro-a da direita para a esquerda até poder distinguir plenamente as personagens que fazem parte da foto nela inserida. Vejo tudo meio esmaecido. Afinal, ela já alcançou 41 anos e completa mais um no próximo mês de junho, aniversário de nossa cidade. Observo cada uma das figuras: minha filha Ângela, encabulada nos seus 11 anos; Silvinha, mais á vontade, deliciando-se com toda festividade que presenciara; Fábio, nos seus 4 aninhos, refestelado no colo do pai. Também eu, vivendo um momento de alegria. Para o Prefeito Perin , uma pausa feliz com o marco que conseguira ao cumprir o compromisso assumido consigo mesmo de realizar um velho sonho da população de Rio Claro: o término, no primeiro ano de seu governo, do prédio da nossa Prefeitura, então chamado “Palácio de Granito” , no primeiro ano de seu mandato. Lindo, completo, perfeito em cada detalhe.

A cerimônia da entrega do prédio havia terminado. A população que ocorrera ao evento já se fora: D.Lúzia e Dr.Schmidt, convidados especiais, autoridades, amigos, imprensa. A corporação musical que cessara sua apresentação e que havia enchido o ar com belos eflúvios, já marchava ao longe.

Num momento mais tranqüilo, um amigo retardatário pediu-nos uma pose para uma foto. Dias após, enviou-nos a caneca, onde inserira a foto, produto de sua fabricação.

Estávamos no Gabinete do Prefeito. Tudo aí era novinho e belo. Na mesa de trabalho havia um botão de rosa, colhido no Jardim Público defronte ao prédio inaugurado. Era uma solicitação minha ao inigualável jardineiro chefe Miguel Felipe, que houvesse sempre uma flor no “solitário” que eu dera ao meu marido.

Na sala de reuniões,contígua ao lugar dessa foto, havia uma enorme mesa feita de uma tábua inteiriça, de jacarandá, vinda da Bahia. Nas paredes, quadros de artistas rioclarenses , onde se sobressaia o do renomado pintor Nicola Peti sobre a fundação de Rio Claro. No chão um carpete muito fofo onde o Fabinho aproveitava para virar cambalhotas (quando não havia ninguém por perto, principalmente o pai... )

Revendo a foto incrustada na caneca passam pela minha cabeça os 4 anos de doação de meu marido e de nós, sua família, á nossa cidade.A exclamação da Ângela numa entrevista a um jornal :”eu cresci e meu pai não viu !” retrata bem o desenrolar dessa fase de nossas vidas nesses anos ! Hoje, paro e reflito: valeu a pena? [Leio em jornais, notícias de políticos de hoje que pensam barganhar o primeiro andar do prédio do Paço Municipal, com os 4 milhões de reais que acumularam]. (Será que os 30 dinheiros de prata inflacionaram tanto?). Será que esse sonho da população que custou tanto empenho de dois prefeitos , não merece um momento de reflexão dos que deveriam zelar pelo patrimônio e história da cidade que representam?

Cortam-se árvores símbolos, perdem-se prédios que fazem parte da história do município, não se reverencia o passado da cidade ... E agora, culminam por desejarem transportar o gabinete do Prefeito e todo seu “staffe” para um barracão deixado pela administração da CESP, querendo acabar de vez com a dignidade que deve estar implícita no cargo máximo de quem dirige uma cidade.

Um homem tem o tamanho de seus sonhos que transforma em realidade. Feliz de quem pôde ver por inteiro o sonho dos Prefeitos Perin e Schmidt

Se nada mais restar, ficará a foto despretenciosa mas que marca um momento de grandeza de homens capazes!

Os olhos da vovó

Texto de Alice Ferreira

O olho, um dos órgãos vitais de nosso corpo e de muita importância. Com ele sabemos quando está dia e noite, acompanhamos o crescimento de uma planta, de uma criança, de uma construção; distinguimos cores, perigos de ordem física e temporal. Com ele podemos observar em que direção as pessoas caminham e o que fazem. Podemos caminhar nas ruas, admirar um vitrine de loja e sua decoração, admirar a beleza da natureza, o nascer e por do sol. Mesmo miupe, com auxílio de óculos podemos ver . E muitos outros benefícios ele nos traz, quando os temos sadios.

Pois bem, minha querida avó que chamava-se Alice, nada disso pode ver em grande parte de sua vida, pois começou com catarata e glaucoma. Fez cirurgia, mas nada resolveu seu problema. O olho direito que tinha glaucoma teve que ser extraído , pois era uma dor insuportável, que vovó tinha vontade dela mesma arrancá-lo.

Para que minha avó tivesse um aspecto melhor, minha tia, mandou fazer uma prótese do olho. Vovó usou pouco, porque não conseguiu adaptar-se. Dizia ela pra minha tia :”- filha, pra que colocar um olho, se eu não vou enxergar nada, o que mais importa é que graças a Deus, estou sem dor.

Este problema de visão, para minha avó, não a deixou uma pessoa triste e nem amarga para a vida.. Nunca a vi queixar-se ou sentir revolta por isso, pelo contrário, ela participava de nossas vidas com muita intensidade. Em sua escuridão, ela nos transmitiu muita clareza, fé, ternura, paz, confiança e muitos outros sentimentos bons.

Além da falta de visão, ela também teve problema com os ossos, que a invalidou, passando a ser acamada. Ela sempre tinha em suas delicadas mãos um rosário, com o qual ela rezava por todos nós e por todos que solicitavam suas orações. Este rosário era sua grande relíquia, que trouxe do Líbano, sua terra natal. Sempre tinha uma palavra amiga e de conforto a todos que a visitavam.

Gostava de reunir os netos em volta de sua cama, para nos contar estórias e sobre sua vinda ao Brasil. Gostava também de tomar sorvete, da Kibon, o de esquimó (de caixinha).
Eu adora ouvi-la dizer no meu aniversário. “ a deus parabéns, minha filha.” Tenho boas e queridas recordações de minha avó.

Pessoa frágil e com limitações, seus problemas de saúde, mas uma fortaleza de amor, santidade, carinho e muita serenidade!