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Uma grande vitória poder divulgar o nosso projeto!
A OFICINA DE LEITURA E CRIAÇÃO LITERÁRIA
3A. IDADE CLARETIANAS FOI UM DOS PROJETOS SELECIONADOS PARA APRESENTAÇÃO NO III FÓRUM DO PLANO NACIONAL DO LIVRO E DA LEITURA E NO III SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE BIBLIOTECAS, EM AGOSTO DE 2010.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Oficina Março 2011



Retomamos nossas atividades em fevereiro de 2011, com a 6a. edição de nossa oficina literária. Esse ano pretendemos trabalhar muito com os entrelaçamentos entre narrativa e memória, partindo do pressuposto que:

“O TEMPO atua sobre as pessoas e faz com que seja o presente o elemento formador da percepção sobre o passado. Nesta medida, são fragmentos de memória que se retomam do fundo de cada sujeito social para dizer das marcas que ficaram de um tempo aparentemente esquecido, mas que lá está para ser visto pelos olhos de hoje”. (HALBACHS)

Queremos ver algumas lembranças pelos olhos de hoje, e escrever é uma forma de chegar a esse objetivo. Vamos estimular a fabulação criadora, lembrando que memória também é invenção. Assim, o primeiro exercício do ano tem o mote "Eu me lembro". Confiram os textos e boa leitura.

Profa. Sandra Baldessin

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Oh trem bão! Volta!


Vera Gracia Lorenzon

De uma das muitas viagens de trem que fazíamos nas férias escolares, de Marília para Rio Claro, para visitar parentes em épocas como o Natal, Carnaval entre outras comemorações.

Nosso pai, ferroviário exemplar, nos instalava no vagão de primeira classe, ajudando nossa mãe a acomodar a enorme mala com nossas roupas e a sacola com lanches, mais saudável para seus quatro filhos de 14, 12, 10 e 8 anos.

Havia certa disputa para se ficar na janela do trem e para evitar confusão, nossa mãe fazia revezamento. Por ser a mais velha da turma e por estar sem par, normalmente sentava-me junto a outro passageiro e logo rolava um papo. Muitas amizades surgiram assim, que eram continuadas via correio.

Oh! trem bão!

Numa destas viagens, lembro-me de estar com um vestido azul piscina, pregueado, cujo tecido facilmente se amassava, portanto procurava ficar sentada como uma “lady”.

Após algumas horas de viagem passava o carrinho de lanche, deixando “aquele” cheirinho de mortadela no ar que era degustado com guaraná. Logo após, vinha o jornaleiro com revistas e revistinhas em quadrinho que nos fascinavam.

Ah! trem bão!

Nos anos setenta, adulta e já de volta á cidade azul, passei três anos viajando de trem para São Carlos, complementando meus estudos na Escola de Documentação e Biblioteconomia de São Carlos, hoje anexada á UFSCAR.

No percurso de uma hora de viagem, aproveitava para ler e rascunhar alguns exercícios, ou para descansar a vista apreciando a paisagem desfilando pela janela do trem.

Oh! trem bão !Volta ...





Quando doer, diga eu te amo...

Maria Inês Dominiquini


Você se lembra da sua infância, quando caia e se machucava ? Lembra do que sua mãe fazia para acalmar a dor?


Eu me lembro muito bem o que minha avó a nona Ernesta fazia. Levava-me no colo até sua cama e beijava o machucado Então, ela se sentava ao meu lado, pegava minha mão e falava : - Quando doer, aperte minha mão e eu vou dizer : “Eu te amo”

Era sempre assim, eu apertava sua mão e sem falhar uma vez ouvia as palavras : “querida, eu te amo”.

Ás vezes eu fingia ter me machucado, só para passar por este ritual com ela. A medida que fui crescendo, o ritual mudou , mas minha avó sempre encontrava um modo de diminuir a dor e aumentar a alegria, em qualquer área de minha vida.

Numa época difícil, durante o segundo grau, ela tinha sempre os meus chocolates preferidos, quando eu chegava em casa.

Lá pelos meus vinte e poucos anos, vovó muitas vezes me telefonava num fim de tarde, convidando-me para vermos o pôr do sol ou o nascer da lua. Deixava bilhetinhos amorosos sobre meu travesseiro, quando chegava tarde em casa e quando fui morar sozinha, mandava-me docinhos caseiros, agradecendo as visitas que eu lhe fazia.

Mas, minha melhor lembrança, continuava sendo ela segurando minha mão quando eu era pequena e dizendo: “ Quando doer, aperte minha mão e eu vou lhe dizer: Eu te amo!”

Eu já tinha trinta e tantos anos, quando meu pai telefonou para o meu trabalho. Era um homem seguro e lúcido, mas a voz soava confusa e amedrontada.

- Filha, há algo errado com sua avó. Já chamei o médico, mas por favor, venha logo que puder.

Quando cheguei , papai andava de um lado para o outro na sala e vovó deitada no quarto , olhos fechados e as mãos sobre o peito. Chamei por ela tentando manter a voz a mais calma possível.

- Vovó, estou aqui.

- Querida, é você, ela balbuciou.

- Sim, vovó, sou eu.

Eu não estava preparada para a próxima pergunta e quando a ouvi, congelei, sem saber o que responder.

- Querida, eu vou morrer?

Meus olhos se encheram de lágrimas enquanto olhava minha avó querida ali, deitada, tão desamparada.

Ao tentar descobrir o que responder, pensei : - o que vovó diria num momento desses? Hesitei por um instante, esperando que as palavras viessem.

- Vovó, não sei se você vai morrer, mas fique tranqüila, tudo acabará bem.Apertei sua mão. “Eu te amo”.

- Ela gemeu: - Querida, sinto tanta dor.

Mais uma vez fiquei sem saber o que falar. Sentei ao seu lado na cama e me ouvi dizendo: - Vovó, quando doer, aperte minha mão e vou te dizer : “eu te amo”.

Ela apertou minha mão: - Vovó eu te amo.

Esta cena se repetiu muitas vezes, até a sua morte.

Nós nunca sabemos quando virão os momentos em que seremos testados. Mas, sei que , quando chegarem, com quem quer que eu esteja, oferecerei o ritual de amor de minha avó.

- Quando doer, aperte a minha mão e eu vou dizer: “eu te amo” !

São tantas histórias

Rosemarie B. Grassmann Bóbbo

O texto da D. Rose veio escaneado com as fotos que ela inseriu. Deve ser lido de 1 a 3.












Sucessão inesgotável de lembranças

Antonio Moreira

A vida é uma sucessão inesgotável de lembranças - um eterno "EU ME LEMBRO". Daí, a validade do título desse trabalho, eis que intimamente ao que temos mais valioso, que é a memória.
E tudo é belo, quando as coisas de que lembramos nos dão alegria, prazer, emoção, tais como: a infância, nossos pais, nossos avós, o afeto e o carinho deles em relação aos filhos e netos e aos parentes mais distantes. As pequenas e grandes vitórias pessoais de todos nós, a partir das notas do colégio. O cair da tarde, o cultivo do BEM, para os quais diária e constantemente nossos pais nos chamavam a atenção. A solidariedade de modo geral e particular, os pequenos e grandes adeuses, os passeios às casas dos amigos e parentes, a comidinha feita por nossas avós, o encontro com os primos, que são irmãos de sangue. O declamar de poemas na escola, na forma orientada pela professora - eu me lembro de todas as professoras. Eu me lembro que meu pai gostava de ouvir o cantor AUGUSTO CALHEIROS, principalmente quando ele cantava " CAI A TARDE TRISTONHA E SERENA, EM MACIO E SUAVE LANGOR" Esta última palavra despertou-me a curiosidade, e muito cedo descobri que langor é originário do Latim - languor -, e em portuuês quer dizer moleza, falta de ânimo, indulgência, complacência, etc. Eu me lembro, com saudade e carinho, das tardes dançantes, na Casa do Estudante, no Rio, realizadas num salão bonito e simples, em ambiente familiar, "fiscalizado" por uma senhora importante e educada.
Ela conhecia todas as meninas e meninos. Todos cumprimentávamos aquela senhora, com respeito, que passava à admiração. Sua "atuação" era tão grande, afetiva, que qualquer namorinho tinha de passar pela aprovação dela, que era um amor de pessoa.
Era tudo muito lindo, muito puro, ingênuo mesmo, creiam-me. Daqueles momentos eu me lembro e me membrarei para sempre, eis que imorredouros.
Por não cultivar passado sombrio, triste ou revoltante, faço o possível, segundo minha frágil condição humana, para não cultuar ódio, mas acontecimentos sadios, os quais, com imenso prazer, EU ME LEMBRO!

Eu me lembro

Maria Helena Bufolin Ceccato


Nasci na primeira metade do século passado, mais precisamente em 1949.


Nestes anos vividos vejo que tudo mudou para melhor.

Na década de 50 existiam pouquíssimos carros na cidade, as charretes serviam de táxi. Em frente à estação ferroviária havia até o ponto de charretes, onde tinha uma fonte para os cavalos beberem água.

Até a década seguinte, lembro-me de leiteiros e padeiros fazendo entregas de madrugada. Na avenida Visconde do Rio Claro, que ainda não tinha esse nome, o rio corria a céu aberto e havia pontes de madeira para passagem. As ruas centrais eram de paralelepípedo, portanto as águas das chuvas penetravam no solo pelas juntas destes, e não havia enchentes.

Neste tempo não havia supermercado, as compras eram feitas nos armazéns, onde as pessoas faziam o pedido no balcão, e o balconista ia pegar cada produto. Quase nada era comprado à vista, havia a caderneta onde eram feitas as anotações para só ser pago no dia do pagamento do freguês. Até a palavra freguês desapareceu do vocabulário Nem pensar que havia esta quantidade de marcas e variedade de produtos que existe hoje. Era um hábito de todos os atendentes usar o lápis preso na orelha.

Eram poucas as famílias de tinham televisão, e onde tinha uma, a vizinhança lá se reunia, era a chamada televizinho, a TV da solidariedade. Ninguém reclamava da imagem, hoje quando assistimos a uma gravação daquela época, aquela imagem em branco e preto e toda chuviscada, podemos comparar os avanços da tecnologia.

No final desta década e começo dos anos 70, as ligações telefônicas intermunicipais eram feitas somente com o auxílio da telefonista, e nunca era completada na hora, demorava no mínimo meia hora, para a telefonista completar a ligação.

Para quem quisesse trabalhar em um escritório, saber datilografia era imprescindível, tinha a importância da informática hoje. Na década de 70 não havia computador nem nos bancos. Cada cliente bancário possuía uma ficha onde cada movimento era anotado. Para descontar um cheque ou fazer um simples depósito, tínhamos que enfrentar as intermináveis filas bancárias. No comércio também era assim, os movimentos do crediário eram marcados em fichas manuais, ou até mesmo em cadernos de anotações.

Na área da medicina e odontologia o que caminhava a passos lentos, começou ganhar mais força. A partir da colocação do flúor na água distribuída na cidade, tivemos mais saúde bucal, e os tratamentos também avançaram. Até 1970 até jovens de 20 anos colocavam próteses parciais e até totais por não haver tratamento, ou não terem condições financeiras para tal. Era comum ver pessoas com falhas de dentes, ou dentes maltratados.

O desenvolvimento está se acelerando cada vez mais rápido, e com isso os problemas só mudam de lugar. O consumismo tomou lugar do que antes sentíamos falta.

Por outro lado existe a felicidade de ver que quase todos os lares tem os eletrodomésticos necessários para seu uso. Quase todas as pessoas têm um telefone celular ou mais de um, o que facilita muito a vida de todos. Tornou-se muito acessível adquirir um automóvel, uma casa popular e um computador. Existe também o computador de mão o notebook.

Eu me lembro, e como!

Mariângela Januária Pezzotti Gomes


Eu me lembro e como...


Grande perda aconteceu na minha vida nos anos 70, 21 de novembro. Minha mãe havia falecido. Acredito das filhas, a mais apegada a ela. Foi difícil acostumar-me com sua ausência.

Ainda em 72, sentindo muito a sua falta, com imorredoura saudade, lecionava eu na Escola Estadual Monsenhor Martins. Era Maio, mês que se comemora Dia das Mães. Havia lido no jornal que uma das casas mais conceituadas no comércio da cidade (Casa Farani, localizada na Rua 3 esquina da Avenida 6), instituía um concurso entre as primeiras séries das escolas estaduais e particulares, para que os alunos elaborassem uma frase criativa em homenagem as mães.

Levei e li a notícia à classe. Logo após a leitura como sugestão, tracei um perfil sobre as mães e principalmente sobre a minha mãe. Falei da alegria de ter seus filhos, do seu amor, carinho, renúncia, dedicação e exemplos.

Quando parei de tecer o comentário, vi alguns bracinhos erguidos querendo indagar alguma coisa. Entre eles me chamou a atenção, o de uma aluna portadora de dislalia, muito inteligente, à qual já me acostumara a entender sua fala.

Ela disse:

- Professora, escreve na lousa para eu copiar, Minha Mãe Minha Vida !

Fiquei muito emocionada, esta frase me levou às lágrimas!

E assim foi: ela copiou e enviou ao concurso. Foi classificada em primeiro lugar.

O diretor da escola, prof. Benedito Zaine, acompanhou a aluna e sua mãe ao estabelecimento comercial para receberem os prêmios que foram: para a aluna Rosângela uma linda boneca e para sua mãe um aparelho de jantar em porcelana.

Eu como professora, me senti muito gratificada e feliz por levar meus pequenos alunos a valorizar o amor por suas mães e expressando seus sentimentos, realizar o sonho de através do concurso homenageá-las !

Eu me lembro muito e como...

A dor só minha

Geni Deolinda Bizzo


Eu me lembro da dor doída e do gosto amargo da decepção, quando um tsunami entrou Rua Carlos Gomes adentro, atingindo a praça arrastando tudo. Os balões de gás coloridos se enroscavam nas altas árvores frondosas. As bandeirolas verde-amarelas arrancadas das mãos das crianças voavam, e todos os sonhos guardados para esse dia em especial foram-se desmanchando. Era assim que me sentia naquele dia fatídico.

Eu me lembro...

Praça Rui Barbosa apinhada de gente naquela linda manhã de setembro. O sol saía das entranhas da terra com seu brilho morno, prenunciando a primavera e ressaltando ainda mais o colorido das crianças que pulavam ao redor do coreto enquanto aguardavam a festa. Vendedores de uniforme e boné se esmeravam para atender os pequerruchos. Balões de gás, bandeirolas do Brasil, é claro, algodão-doce, sorvete, pipoca, pé de moleque. Os pais atendiam como podiam, mas com muito gosto, por participarem de um evento raro na provinciana cidade.

De uniforme azul e branco, sapatos pretos e meias soquete, gravata preta, cabelo arrumado, leve maquiagem e um vazio no estômago provocado pelo longo jejum que se misturava à ansiedade, eu, toda faceira, aguardava feliz o início do cortejo.

Minhas colegas de turma e eu havíamos formado, como abelhas operosas, o pelotão de frente, na rua defronte ao colégio. Daí faríamos o trajeto pela rua Carlos Gomes, contornaríamos a praça se seguiríamos no desfile cívico da Independência. Nós, normalistas, estávamos orgulhosas: era nossa a honra de seguir os lindos jovens do Tiro de Guerra que conduziam o Pavilhão Nacional. Na formação privilegiada podíamos observar tudo e trocar olhares, já prenunciando o encontro para o final do compromisso. O tempo se arrastava e uma longa espera já nos preparava para um desfecho cruciante.

Estranhando a demora, enquanto aguardávamos o início cochichávamos, tentando entender o que estava acontecendo. Não podíamos sair da formação: a disciplina era rigorosa, e tudo que não queríamos naquele momento era que alguém nos chamasse a atenção na frente dos pracinhas.

O suor escorria e o penteado já se desmantelava quando, finalmente, veio a triste notícia... Silêncio cósmico. Espanto, um misto de tristeza e angústia tomava conta da multidão. A voz empastada do diretor anunciava o fim do desfile que não começara. Acabávamos de perder, em um trágico acidente, monsenhor Victor Ribeiro Mazzei, nosso pastor de almas durante muitos anos e que agora retornava à cidade para os festejos da Independência. Era, sobretudo um cidadão araçatubense amado por todos, católicos ou não. Não haveria desfile, não haveria festa, não haveria sorvete de coco queimado, não haveria encontros furtivos, não haveria aquele encontro sonhado. Somente dor e desolação.

Eu me lembro...

Dispersamo-nos e nos dirigimos à praça. Ao invés da algazarra da criançada feliz, somente o soar melancólico do enorme sino da Igreja Matriz que se preparava para a cerimônia fúnebre. Minha cabeça girava num misto de fraqueza, dor e revolta.

Eu me lembro da sensação terrível do grito de dor na garganta e hoje tenho a certeza de ter vivido horas no meio de um tsunami. Minha dor maior era de frustração. No meu mundinho interior, bem lá dentro, sentia por não sentir a mesma tristeza de todo mundo. A dor doída era particular, só minha.

No presente, recordo meu passado

Hedi Duarte


Agora, já aposentada e tendo somente as responsabilidades de meu lar, lembro como minha vida tomou rumo diferente daquele que almejei na juventude. Mamãe me contava que, quando eu era pequenina, antes de entrar na escola, se alguem me perguntasse o que eu queria ser quando crescer, minha resposta pronta e sem hesitar era: "cozinheira"!


Nasci, cresci e estudei na Alemanha, e lembro-me bem, apos alguns anos , já na 6. ou 7. série ginásial, tomei a firme decisão que eu queria ser jornalista internacional. Naquele tempo ainda não havia televisão e a melhor informação era a leitura. Lendo as mais diversas reportagens e vendo lindas fotos de lugares longuinquos , comecei imaginar como a vida profissional do reporter responsavel por estas lindas matérias deveria ser diversificada, eu gostaria de viver assim. Continuei estudando com mais afinco. Me imaginava buscando acontecimentos novos em outros países e fotografando tudo para posterior publicação. O melhor de tudo que haveria uma fonte pagadora de minhas despezas, assim poderia conhecer muitos povos e lugares diferentes "de graça".

Minha viagem internacional inaugural custou bem pouquinho dinheiro mas muito esforço fisico. Cinco colegas de escola e eu fomos de bicicleta até Londres. Senti muita emoção ao ouvir e ter que falar sómente ingles, senti mais insentivo para minha futura profissão.

Até que.......um belo dia papai reuniu a familia e anunciou que iriamos imigrar para o Brasil, pois ele já viveu e serviu 2 guerras mundiais e seu desejo era viver num canto ensolarado do mundo onde poderia viver e morrer em paz.

Em São Paulo conheci meu marido. Ele trabalhava e estudava engenharia mecanica industrial. Para ajudar nas despesas, ele começou fabricar em casa, à noite e fins de semanas, copiadoras para fotocópias. A fotocópia era a antecessora da xerox. A noite, apos lavar a louça do jantar, eu levava um cafézinho e fazia companhia para ele. Foi assim que conheci parafusos, engrenagens, aço inoxidavel, alumínio, celeron,entre outras matérias primas, e...graxa,...e....gostei! Resolvi estudar engenharia de maquinas tambem. Arrumei uma secretária de casa para poder estudar e trabalhar com meu marido o resto do tempo disponivel. Com o surgimento da xerox, as fotocópias "morreram".

Meu marido sempre amou fotografias, era um otimo fotoamador e colecionador de maquinas fotograficas, fazia nossas fotos em casa, até posters muito grandes, conhecia bem as maquinas necessárias para confeccionar fotografias dentro do quarto escuro. Resolvemos juntar o aprendizado nos estudos com o prazer de atuar dentro do ramo da fotografia, e iniciamos nossa trajetória de fabricantes de maquinas para laboratório fotográfico. Para aperfeiçoar os serviços de escritório que estavam a meus cuidados, fiz um curso por correspondencia de contabilidade. E como a parte burocratica não ocupava o dia todo, eu fazia tambem a instalação elétrica das maquinas e seus paineis de comando . Durante períodos que faltavam funcionários, eu trabalhava em torno mecanico, torno revolver, furadeiras, solda eletrica, frezadora de engrenagens, pintura de revolver e outros serviços necessários. Meu broto carinhosamente me chamava de "minha torneirinha". Assim labutamos, de mãos dadas, pela vida entre maquinas operatrizes, matérias primas, graxas e tintas, para finalmente termos o produto para comercialização e consequentemente a garantia de nossa sobrevivencia.

Porém, meu sonho da juventude não congelou! Trabalhamos muito, sim. Durante os primeiros anos foi só trabalho. Conseguimos comprar nossa propriedade e apos 10 anos nasceu nosso filho. Aos 31 anos de minha vida no Brasil, fomos pela primeira vez para minha terra natal. Meu marido adorou, voltamos para lá algumas vezes e conhecemos tambem varios outros países da Europa.

Vivemos assim felizes por 45 anos, agora estou sozinha há 11 e ainda gosto de viajar, tanto em nosso país que é bonito por natureza, como no exterior.

Hoje faço uma retrospectiva de minha vida e me sinto feliz como tudo desenrolou, talvez até um pouco orgulhosa por tambem nos termos colaborado um pouquinho com o atual progresso de nosso lindo país.

Campinas, 27 de maio de 1968

Letícia Delben Brunelli

Obs. Ao realizar o exercício, Letícia lembrou-se desse poema, escrito em 1968, e que guarda relação com o tema da oficina. Assim, publicamos os dois textos, pois como afirma a nossa aluna: "Se esta simples observação, não fosse relatada num poema, com certeza, teria se perdido e nunca se transformaria numa lembrança."


(Seis horas da tarde. Centro da cidade. Espero o bonde, que me levará para casa. Gente que passa conversando ou pensando em si mesma.O barulho ensurdecedor dos pássaros numa imensa árvore da praça. Eu, sozinha, observando os homens e os pássaros ...)

Será que estão ouvindo?

Nem ao menos levantam os olhos,

Pregados que estão no solo.

Ouvidos fechados

De seus egos, trancados!

Passos rápidos

Que levam aos mesmos lugares,

Pelos mesmos caminhos.

Sensibilidades narcotizadas pela rotina.

Ninguém parece notar

voltam-se para a poeira do chão

mesquinha e passam indiferentes.

Será que estão ouvindo?

Nem ao menos levantam os olhos!

Não existe nem vento, nem brisa.

O ar não ousa perturbar a sinfonia.

Mas tudo se movimenta

São as folhas que tremulam

Ou são os pássaros que saltitam ?

Não sei dizer.

Pode ser que cada folha se torne um diapasão

que vibra e chora neste entardecer tão lindo.

E ninguém pode me dizer porque essas aves cantam .

Ninguém . Todos estão ausentes.

Será que os pássaros querem despertar os homens,

para o tempo que passa,

ou para obrigá-los a olhar o céu ?

Cada pássaro se tornou um beija flor.

Cada pássaro se tornou um colibri.

Porque isto tudo?

Ninguém vê.

Ninguém pergunta, porque?

Será que estão ouvindo?

Nem ao menos levantam os olhos!




Agora, o texto do exercício atual:

A menina curiosa


Eu me lembro ... de um susto, de uma dor, de uma cena apenas.


Mas agora, pensando melhor, posso imaginá-la por completo!

Eu, menina, lá com meus nove anos, morava ao lado dos meus avós.

Meu avó Artur era alfaiate e em um dos aposentos da casa, trabalhava entre moldes, tecidos e tesouras.

Mas o que mais me deslumbrava, eram as máquinas de costura. A dele, a mais robusta e a mais dotada de recuros, ficava no centro da sala. Num dos cantos, a outra, mais simples, mas não menos atraente, era de minha avó.

Eu passava os dias na casa da minha avó. Minhas tias e meu tio, irmãos de minha mãe , eram ainda solteiros. Lá, eu reinava, paparicada por todos. Porém, a sala de costura me era vedada.

Um dia, consegui ! Me vi sozinha lá dentro, entre tantas tentações. Uma das máquinas, da minha avó, talvez, estava montada, com a linha entrepassada, prontinha para ser usada.. Peguei um retalho, sentei na cadeira, coloquei o pedaço de tecido sob o pé calcador, abaixei a alavanca. Pronto ... agora era só colocar os pés no pedal e realizar meu sonho : costurar !

É lógico que esta tarefa deveria requerer experiência. Era preciso, ao mesmo tempo, movimentar os pés para colocar a máquina em movimento e segurar o tecido, para direcioná-lo.

Meus pés começaram tímidamente se movimentar sobre o pedal. A medida que eu ia aumentando a velocidade, o tecido corria apressado, puxando para trás, pela chapa de dentes sob o pé calcador. Então, o imprevisto !

Minha mão direita foi puxada junto com o tecido e meu dedo central foi transpassado pela agulha, que ficou fincada no meio da unha.

Com o horror da cena, meus pés se paralizaram e lá fiquei presa, como um animal na armadilha.

Todos vieram correndo, atraídos pelos meus gritos . Minha avó, deve ter sido ela, retirou minha mão das garras do monstro.

Além do susto, da dor momentânea e da vergonha de ter sido pega em fragante, pouco sangue foi derramado.

Acho que chorei muito para condoer o coração de minha vovozinha, que só fez colocar meu dedo dentro de uma xícara de café, cheia de álcool, pois nada poderia ter sido feito além disso.

Essa a pequena estória que fui buscar nas lembranças de minha infância!

Como disse, Heluane de Souza, em um de seus artigos:

“As lembranças , por diversas vezes, reivindicam-nos vida, contornos, cores, que transformem em imagens o que na mente é história ...”

Recordar é viver

Maria de Lourdes Santos Pinto


Dando tratos à minha memória, veio-me a imagem do Museu do Ipiranga, ícone da História do Brasil.


Ao completar dez anos, ganhei como presente de meu pai a visita deste Museu, o mais antigo da cidade de São Paulo. Foi maravilhosa. Papai era professor, eu e ele fazíamos inúmeros passeios , eu adorava a sua companhia. Ele tinha sempre uma sábia explicação para tudo o que víamos de interessante. E assim aconteceu no Museu. Ele me deu uma aula de História do Brasil muito proveitosa.

Passaram-se os anos, minha infância, minha juventude, mocidade e agora cheguei á idade das recordações, umas tristes, outras alegres, mas todas fazendo parte de minha vida.

Numa manhã, não muito distante, participando de uma excursão á São Paulo, com um alegre grupo de colegas da terceira idade, da Faculdades Claretianas. Partimos de ônibus para uma visita ao Museu do Ipiranga. Eu estava meio ansiosa para chegarmos, pois iria rever, após longos anos as maravilhas do Museu, o mais antigo da capital do Estado, inaugurado em 1895.

Chegamos !

O que meus olhos viram, me causou assombro: uma imensa construção rodeada de belíssimos jardins, muito bem cuidados; são uma réplica dos jardins do Palácio de Versailles,na França. Fiquei maravilhada, “ganhei olhos de poeta” ... “os poetas ensinam a ver”; mas, ver é muito complicado. Cada pessoa enxerga de maneiras diferentes. Há pessoas de visão perfeita e nada vêem.

Outras construções também são vistas: a Casa do Grito, o Monumento da Independencia e a Capela Imperial Leopoldina. O prédio do Museu é majestoso e é dividido em três partes: o subsolo, o térreo e o primeiro andar.

Em cada uma delas existem salas ilustrando partes diferentes da história de São Paulo e do Brasil.

O que mais me chamou a atenção foi o saguão de entrada, lindíssimo. Do lado esquerdo da escadaria de mármore branco há um corredor onde se encontra um carro de bombeiro movido á tração animal, muito interessante. Na ala esquerda estão inúmeros quadros que ilustram o início da história do Brasil, como a primeira Missa e Desembarque de Cabral em 1500.

Finalizando, no primeiro andar, fica o Salão Nobre; ai me deparei com a imensa tela da Independência ou Morte. Esta não me saiu da memória, pois ocupa quase toda a parede da sala. Esta tela foi uma das imagens que ficaram gravadas em minha memória, e após setenta anos, ao vê-la novamente, trouxe-me saudosas recordações da minha infância, quando visitei o Museu com meu saudoso pai. Lembro-me ainda de suas palavras sobre a vinda da corte portuguesa para o Brasil. Ele me narrava a história do Brasil com profundo conhecimento ; eu me encantava em ouvi-lo.

Voltando ao presente, na sequência, faço um comentário ; vale a pena conhecer o Museu do Ipiranga.

Muitas de nossas colegas ainda hoje na Faculdade, tiveram a felicidade de visitá-lo, onde pudemos ver um grande acervo de esculturas, quadros, louças, jóias, peças religiosas e documentos, encantando nossos olhos e ampliando nossos conhecimentos sobre a história da Sociedade Brasileira, entre os séculos XIX e XX.

Aproveitando esta oportunidade, quero prestar uma singela homenagem ao meu pai.

“Papai, que você esteja junto do Pai Eterno!”

“Papai, minhas eternas saudades!”

Você foi para mim ‘’Pai”, “Amigo” e “Mestre”.

Sua filha, Maria de Lourdes.

Eu me lembro da Páscoa

Adelaide Dalva T. Garbuio

Da minha infância junto de meus pais e irmãos.


Vivíamos em uma chácara bonita na cidade de Analândia. Meu pai, Alfredo; minha mãe, Filomena e meus irmãos : Benedito, Valdemar, Deuclides, Antonio, Maria, Celeste, Antonieta, Helena, Ordália e eu (Dalva). Éramos uma família que trabalhava cuidando da chácara onde meu pai era administrador.

Minha mãe, Filomena, foi quem nos ensinou a gostar de música. Lembro-me, parece que foi ontem, ela, em seus afazeres, cantando ... E a fonte a jorrar, chua, chua e as águas a correr, chuê, chuê ...

Meus irmãos aprenderam sozinhos a tocar violão e gaita. Tocavam escondidos de meu pai no paiol e no moinho de fubá. Meu pai se zangava porque queria que fossem trabalhar na lavoura. Nós sempre gostamos de música ! Minha mãe nos ensinou a gostar !

A Páscoa era a data mais importante e mais significativa para nós. Mesmo os que moravam em São Paulo vinham, ajudavam na colheita de algodão e festejavam a Páscoa. Meu pai preparava o leitão e minha mãe assava. Fazia deliciosos pães. Era só alegria a família reunida,as vezes, só nesta data.

Que saudades eu tenho dos meus pais e meus irmãos quando se aproxima a Páscoa.

Que saudades da Nossa Páscoa !

O rio distraído

Lícia Monaco Perin

Nossa vida é estranha. Vai passando mansa e serena. Parece um rio que, distraído, corre manso sem pedras ou enroscos que prejudiquem ou consigam mudar seu curso... Porém, de repente, um fato qualquer ocorre e altera nossa mansa vidinha, ás vezes, pelo resto de nossa existência...


Quando eu tinha uns 15 anos e estava na 4. série ginasial do Ribeiro, jogava basquete e vôlei para meu colégio. Estava em Araraquara disputando um torneio regional e nossos times alcançaram o primeiro lugar, conquistando medalhas alusivas ao evento. Nessa ocasião eu não me interessava por bailes e nem sabia dançar. Por ser a capitã de ambas as modalidades esportivas, precisei ir a uma “brincadeira dançante” para receber as medalhas. Um jovem professor de Araraquara me convidou para dançar, não aceitando minha objeção de que não sabia dançar. Depois disso, tomei gosto pela dança e passei a freqüentar matines dançante.

Meus pais se preocupavam muito com o fato de eu querer “abraçar o mundo”. Vivia cheia de atividades : a escola, o basquete, o volei, piscina e agora a dança. Liberais, permitiam que eu freqüentasse as tardes dançantes de domingo no Gremio Recreativo, onde eu já treinava basquete e vôlei pela manhã ( das 7h ás 12 h.).

Morando próxima á Estação Ferroviária subia a pé duas vezes o Morro da Sta.. Cruz. Meus pais só não queriam que eu fosse á domingueira do Ge Ge, depois da sessão das 19h30 min. do Cine Excelsior, para começar melhor a semana.

Mas, um domingo após a sessão cinematográfica, resolvi acompanhar minhas amigas mais velhas e lá fui eu. Minha consciência me dizia que isso não era correto, que eu estava burlando a liberdade recebida., enganando meus pais. Fui.Porém não conseguia acalmar meu íntimo. Não me lembro das músicas que ouvi, do que falavam comigo, do que vi ao meu redor... Estava me sentindo um trapo ...

Nem uma hora se passara , quando no salão de baile, apareceu minha irmã Célia,acompanhada do René, seu futuro marido.

- “O papai mandou buscar você! ”.

Despedi-me das amigas e saímos rumo de casa. Não conseguia dizer uma palavra.Não percebi a rua deserta, a iluminação fraca, a lua que espargia sua luz jogando nossas sombras pelas paredes ... O senso de culpa tomou conta de mim ... Eu me perguntava: “Como pude fazer isso? Como pude trair a confiança de meus pais? O que me espera?”. A rua 2 até a av. 6 n.39, nunca foi tão longa!

Meu pai me esperava no terraço de casa. Ao me ver, com voz contida e baixa de sempre ele me disse: -“Nunca mais faça isso. Agora vá dormir !”

Chorei, arrependida no escuro de meu quarto. Foi a melhor lição de respeito de um pai para com o erro de seu filho. Agradeci a Deus o pai que me dera e o amei muito mais depois disso..

Esse fato marcou minha vida para sempre. Nesse dia aprendi o valor da palavra empenhada e da lealdade. É porisso que eu me lembro ...

Família Adoção Amor

Aurora Ferreira Rodrigues

- Estamos casados há tantos anos e ainda não temos filhos. Mas, já está fazendo falta um bebe para aumentar a nossa família.


- Que tal irmos atrás, diz ele.

- Sim, diz ela, mas terá que ocupar o devido lugar com carinho, educação, escola e principalmente nosso amor.

Em união foram procurar o direito de obter um bebe.

Será menino ou menina?

Não importa, diz ela e ele concordou.

Passaram-se meses quando chegou o aviso que havia uma menina de poucos dias para adoção. Uma avó ficou feliz ao ser convidada para participar desse encontro.

Foram buscá-la e a alegria foi imensa ao vê-la tão pequenina.

Ao entregá-la a pessoa disse: - olhem o dedinho dela, isto demonstra que ela será bem morena, diferente de vocês e a futura mãe lhe respondeu: - viemos buscar o bebe e não escolher a cor. Ela será a nossa filha do coração.

Quando iniciou na escola trouxe a seguinte pergunta: - mamãe, porque eu não sou sua filha de barriga, como minha amiga?

- Sabe porque? A barriga da mamãe é fria e não geraria bebe, mas você sabe, nós estamos felizes com a filha do “coração”.

- E eu, não vou ganhar uma irmã?

Houve interesse por uma nova adoção. Passaram pelo mesmo processo e chegou mais uma menina. Criadas pelo mesmo método, escola, educação, etc.

A mais velha hoje é formada em fisioterapia, trabalha e tem um lindo bebe.

A caçula termina arquitetura este ano.

Não considero a “adoção” cobertura de um lugar vago, mas temos a glória de Deus de te-los conosco, só nos dando “ALEGRIA”.

Muitas vezes

Silvia Galvani Christofoletti

Muitas vezes, somos despertos por sensações estranhas que nos remetem há muitos anos passados: um cheiro, uma palavra, uma melodia, uma imagem ...


Foi uma imagem, uma intrigante imagem, que trouxe á tona recordações guardadas em um cantinho em nossa vasta e seletiva memória. Bastou um olhar mais atento e esse baú se abriu e me presenteou com um momento marcante em minha vida. Foi a ponte que me levou, de novo, á infância, onde as janelinhas do trem vão tirando sucessivos cartões postais da paisagem, guardados até hoje na memória.

Chego ao local onde recordações felizes tomam conta de mim e as cenas preciosas ficaram adormecidas, mas nunca esquecidas. Vejo-me, num casarão da Alameda Santos em São Paulo, sentada no tapete da saleta, admirando uma escultura de mulher, estendida sobre mesa baixa, iluminada pela luz coada através da cortina. Este momento feliz tomou conta de mim. Cena preciosa que meu coração de criança nunca pode esquecer e quando me lembro das pessoas queridas que ali viviam, sinto uma saudade doída.

Essa viagem, feita na memória, me traz de volta á sala, onde a imagem, que me transportou ao encantamento, ainda gira na tela da TV, pois ela faz parte da abertura de uma novela global.

Minha curiosidade levou-me a pesquisar a origem e o significado dessa moderna obra de arte. O autor é um artista plástico da África do Sul, onde apresenta a estilização do que parece ser uma família de mãos dadas. Segundo Hans Donner, responsável pela abertura, o artista conseguiu interligar os braços dos pais com três filhos e transformar isso numa harmonia fantástica.

Convoco, novamente, as lembranças do passado e da pequena sala, meu olhar contempla os membros dessa família feliz da qual pude fazer parte.

Eu me lembro

Texto de Alice Ferreira (Ler do 1 ao 5)